Durante nove meses, a ficha clínica aponta baixa por incapacidade temporária do diretor de campanha. No terreno, os registos fotográficos contam outra história: palcos políticos, ações de campanha, contacto direto com a população. Nuno Filipe Cação Marques, funcionário da Câmara Municipal de Setúbal e figura bem conhecida no meio político local, tem estado no centro das atenções – não por um cargo oficial, mas pelo contraste gritante entre o registo laboral e a sua visibilidade em eventos políticos.
Apresentado publicamente como diretor de campanha de Dores Meira, candidata independente à presidência da autarquia, Cação surge como presença habitual nas iniciativas da candidatura. Segundo testemunhos recolhidos e imagens partilhadas nas redes sociais, a sua atuação tem sido constante e visível – tudo isto enquanto, formalmente, se encontra de baixa médica por razões psiquiátricas.
A situação levanta um problema sério: até que ponto é compatível uma baixa médica com a participação ativa em campanhas políticas durante o horário de expediente? A pergunta ganha ainda mais peso por se tratar de um trabalhador da própria Câmara Municipal, onde se espera o cumprimento escrupuloso das regras que regem a função pública.
Diretor de campanha de Dores Meira nega os fatos
O Setúbal Notícias confrontou Nuno Cação com as acusações. Negou ser diretor de campanha, afirmando apenas apoiar Dores Meira de forma pontual. Já a candidata e a autarquia foram igualmente contactadas, mas até ao momento mantêm silêncio absoluto.
A controvérsia adensa-se quando se olha para o percurso político de Nuno Cação. Com raízes na CDU, foi adjunto da então vereadora Carla Guerreiro em 2013, eleito vogal da União das Freguesias de Setúbal em 2017, com competências na área da cultura e comunicação, e recandidatou-se ao mesmo órgão em 2021. Hoje, rompeu com os comunistas e, segundo fontes próximas da candidatura, assumiu a direção da campanha de Dores Meira, embora sem reconhecimento formal.
Legalidade, ética e confiança pública – são estas as palavras que se repetem entre quem observa o caso do diretor. O uso indevido do regime de baixa médica é, por si só, um tema sensível; quando envolve um funcionário público com exposição política ativa, o impacto é ainda maior.
Resta saber se as entidades competentes irão agir ou se a situação continuará a mover-se apenas no campo das percepções públicas e dos comentários nas redes sociais. Enquanto isso, a linha entre o que é permitido e o que é tolerado vai-se esbatendo – e com ela, a confiança na integridade dos serviços públicos.